"Você
me reclama distância, diz que ando fria, reclama da pouca atenção que lhe dou.
Desconverso com um ‘não é nada’. Você não se convence, me conhece bem. Lhe digo
que é o pouco tempo. Você me olha com esses olhinhos de quem pede para o tempo
voltar e me suplica para abrir o jogo. Suspiro entediada e uma lágrima rola do
seu rosto. Você me diz que quer conversar. Que agora quer conversar. Largo meu
livro e lhe olho, você diz coisas que embaralham meu ouvido e meu coração já
não consegue mais decifrar.
Você
lembra do tempo em que nos conhecemos, pede para que eu resgate aquela minha
mansidão, para que eu não desapegue da minha meiguice. Diz que sente falta das
nossas conversas, de saber o que realmente se passa comigo pela minha boca,
cospe que cansou de tentar ler minhas entrelinhas, assume que não nasceu para
adivinhar. Infelizmente, isso já não me toca tanto, você detecta. Entra em
prantos. Me pede perdão, trezentas vezes perdão. Recorda e reconhece que me
machucou. Que foi um tremendo egoísta e que em momento algum pensou em mim. Mas
ao mesmo que se redime se defende, fala que ter ficado naquele momento só ia me
destruir mais; que se afastou pelo nosso bem. Me pede para não enxergar no
abandono uma falta de amor e sim um gesto altruísta.
Me
calo, não derramo uma única gota. Você se dá conta de que mudei. Baixa a cabeça
e chora um choro baixinho, no entanto desesperado, como eu chorei um dia.
Soluça que foi burro. Que deixou a fraqueza nos afastar, que não deveria ter me
largado ali, sem ninguém. Vejo como fui patética, quando eu era assim. Você se
joga nos meus braços e não lhe nego meus abraços. Você me implora perdão e eu
cansada desse roteiro te digo que não há nada que ser perdoado. Você se
desespera mais ainda, me escorrega dos braços e diz saber como sou rancorosa.
Diz que essa minha falta de reação é fim de amor, pede desculpas outra vez, que
não sabia o que estava fazendo. Pede para eu não deixar o amor morrer dentro de
mim, para seja como for eu ser feliz e me implora por alguma solução. Qualquer
coisa que possa fazer para me trazer de volta, de verdade. Lhe peço para parar
de falar besteira.
Você
enxuga as lágrimas com as costas da mão e abre a boca em outro soluço
escandaloso, assume saber que foi você quem me deixou assim, sem graça de vida;
que o destino, do qual não sou adepta, foi quem nos roubou um do outro, que
sabe que o sentimento meu por você não está sepultado, no entanto, que enxerga
que não tenho jeito. Ainda bem que você sabe, ainda bem."
Gabriela Furtado
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