Te vi outro dia e senti uma dor enorme no peito; olhei para o
fundo dos teus olhos e mergulhei em uma frieza que nunca foi característica
tua. E então, me deu uma aflição tamanha, por saber que contribuí um bocado para
cavar poços fundos e frios em tua alma. Ah, minha pequena, te juro que nunca
quis te machucar. A única vontade que senti depois que te revi foi de
cuidar-te, de tomar-te entre meus braços e cumprir o que prometi há tanto.
Quando teus olhos cruzaram com os meus eu procurei por uma doçura
que te era peculiar, busquei todos aqueles sonhos bonitos que tu tinhas, a fé
que carregava; procurei sentir a doçura que você exalava, a esperança que
transmitia e o amor que propagava, mas não os encontrei. Aonde se esconderam
todos eles, minha boneca, aonde?
E sabe o que também me é estranho além dessa ausência? É que você
continua bonita, na verdade, a beleza que tu trazias parece ter aumentado. Esse
‘quê’ de tristeza te acrescenta algo a mais, dá uma vontade de te explorar, de
procurar até achar teu pobre coração e cuidá-lo como devia ter feito antes, mas
você se fechou, minha flor; criaste um escudo protetor forte por demais que me
impede de enxergar aquela velha criança, é duro crer que as pessoas mudam, e é
mais áspero ainda saber que eu fui um dos responsáveis por essa mudança.
Naquele dia, que eu te vi de novo, a saudades de ti (que sempre me
acompanha) pareceu ter crescido horrorosamente. Quis só mais uma única vez
poder te puxar pela mão e sussurrar ao teu ouvido o quanto és linda; poder
entregar-te aquela flor que eu deixei murchar antes de ir embora; ouvir, só
mais uma vez, você cantarolando acompanhada do dedilhar da viola aquela canção
do Chico que tinha dito que era nossa; queria poder voltar aquele maldito
momento em que você me pediu para partir, implorando que eu ficasse, e te
abraçar, falar pela primeira e verdadeira vez que eu não ia mais te machucar,
que você merecia o mundo e que eu cumpriria a promessa, que te cuidaria para
sempre.
Mas fui burro, meu bem, te escutei e saí pela porta da frente da
sua vida, te dei tempo suficiente para mudar a fechadura e reforçar os
cadeados, e agora, não vejo mais nenhuma janela sequer aberta para eu poder
voltar para o seu coração. O que foi que eu fiz, princesa? Por que fui inventar
de te perder? Será que era tão difícil de enxergar que sem você não tem como
dar certo? Tu não imaginas, meu amor, como foi doloroso perceber que mulher
nenhuma se iguala a ti, minha menina. Ai, como eu sinto falta do nosso amor,
era tão bonito...
Mas eu estraguei. Pronto, acabou.
É, eu sei. Não vou te esquecer nunca. Todas as vezes que eu pensar
que te esqueci, que tu estiver virando uma nevoa nas minhas lembranças eu irei
relembrar; ou você vai me aparecer, só para torturar, ou então, eu vou voltar
para realidade e ver que o que eu quero (o que eu preciso) está contigo. Não
tem jeito mesmo não: eu vou ser sempre teu.
E quer saber outra coisa que eu me pergunto por demais? Se algum
outro cara vai saber tanto de ti como eu soube. Será? Será que esse sujeito,
que nem sei se existe ainda na sua vida, vai saber que você detesta chiclete e
adora jujuba; será que ele vai lembrar sempre que você é dengosa e gosta a beça
de um cafuné; que você gosta do seu suco sem açúcar e do seu café um pouco amargo;
será que ele não vai esquecer que você gosta de ganhar flores e receber cartas;
que ele vai segurar a sua mão ao assistir uma comédia romântica; que ele vai
saber identificar a sua tristeza e ter o dom de te devolver um sorriso? Será,
princesa, será que ele vai saber cuidar de ti?
Mas eu te perdoo todos os dias, criança. Te perdoo por ter sido
tão madura e ter me mandado ir embora, eu te perdoo por não ter me deixado te
ver sofrer."
Gabriela Furtado
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